Pular para o conteúdo principal

Birdman, entre o SuperHerói e o Quase Fracassado Ser Comum


(Uma crítica  do filme sem a intenção de deixar spoilers)
Às vezes você vai a um filme. E se o filme é bom, e significa algo, ele pode voltar à você, à sua mente e coração, diversas vezes. Mesmo longe, dias ou tempos depois, revê cenas e momentos, e revive algumas sensações importantes ou chega a conclusões que precisaram deste tempo para amadurecer.
 Filmes bom assim não perdem permissão mas vão aos poucos se acomodando dentro de nossa memória e emoções, procurando um lugar para ficar.

Birdman não é um filme fácil. A câmera é um dos fatores que chama a atenção, ela se movimenta muito. Talvez você não perceba logo, mas então em certo momento você até pensará se ela tem vida própria e que não está apenas acompanhando os atores. Ela está literalmente tentando entender o que se passa, correndo atrás, girando, afastando, se aproximando. É uma câmera inquieta e que tentar ir ao fundo de cada personagem. Ela parece saber que quase todos estão no limite, buscando ou perdendo coisas que nem sabem direito.

Paralelos entre cinema e teatro são mostrados e falados pelos atores. O elenco entra e sai de ambientes, o tempo todo passando  por túneis e corredores. E a equipe técnica sempre presente, tentando se fazer de invisível. Mas sempre ali, no filme esbarramos neles o tempo todo.

Pois não importa se é teatro ou cinema, a intenção é clara de nos lembrar que estamos sempre entrando em algum palco ou representando alguma coisa.
Não falamos apenas de encenar algo no teatro ou cinema, mas na própria vida, todo o tempo atuando em papéis determinados ou repetindo falas.

Temos uma plateia sempre presente e atuante de diversas formas. Mesmo nas cenas de rua o público também se manifesta. Vaia, brinca, zomba, xinga, chora, se emociona.

O teatro prende e sufoca os atores, em seus camarins e corredores estreitos, nos tempos e entradas de marcação.  O único ponto de fuga do teatro fica em um terraço onde cenas significativas acontecem. Por coincidência, onde existe ar, espaço, e até onde se conseguem enfim falar algumas verdades.
E algumas das melhores cenas do filme acontecem nas ruas. Aí vemos o teatro voltar a ser cinema, e as personagens estenderem-se ao imaginário e ao infinito.

E onde espectadores ou simples transeuntes das ruas tornam-se atores e participantes sem saber.
O próprio Birdman oscila entre a ficção e a realidade, entre o superherói e o quase fracassado ser comum, com um personagem que não sai mais de dentro de si e o confunde e o questiona o tempo todo.

A intenção é incomodar mais do que divertir. Afinal o que é o um bom filme se não um motivo para se falar do próprio cinema?

Ali na tela, está a magia de colar fragmentos e fazer uma montagem de vida e movimento, colocando todos no mesmo palco e tela, dividindo mesmo espaço e tempo.  Pelo menos durante algum tempo, tentando deixar de ser o que é para tentar ser algo mais.

@robertotostes



Postagens mais visitadas deste blog

As Pequenas Grandes Qualidades do Twitter

Tudo tem sua forma e tamanho e proporção, conforme o ângulo, o olhar e o ponto de vista. Vejo o  twitter como algo efêmero e surpreendente. Sempre gostei dele por ser pequeno e grande. Por ser rápido, e na maioria das vezes,  sincero. E mesmo nos seus limites de 140 caracteres, dá e sobra para expressar sentimentos de todos os tamanhos. Ele pode ser tipo um fogo de artifício no meio da noite.  Pode ser também um suspiro após um longo vazio ou tristeza. Pode ser como uma lágrima brotando de repente no canto do olho . Ou uma risada solta, do nada, espontânea.  Pode ser também um grande eco, quando é instantaneamente repetido e retuitado por centenas ou milhares e pessoas. Nem sempre pela mesma razão ou causa. Às vezes se fala besteira mas faz parte. Mas quem diz assina e não pode voltar atrás. Ele é sempre mobilizador e provocativo, viral, barulhento. Como se alguém dissesse naquele momento exatamente o que a gente gostaria de dizer. O Twitter acre

NARCISO E OS ESPELHOS SOCIAIS

Diz a lenda que Narciso era um jovem muito belo mas que não se sentia atraído por ninguém. Um dia ao debruçar-se sobre o lago apaixonou-se pela própria imagem. Não conseguiu mais parar de olhar seu reflexo e acabou morrendo assim. Em tempos de mídias sociais multiplicamos nossa imagem em sofisticados espelhos. Nossas fotos  povoam o facebook e instagram, nossos comentários e opiniões espalham-se pelo twitter e outros programas de mensagem instantâneas. Nossos diários ocupam blogs, qualquer vídeo pessoal pode chegar ao youtube ou vimeo e alcançar milhares ou milhões de pessoas. Já compartilhamos álbuns e imagens pessoais mais na web do que na vida real. Como se nos dividíssemos em múltiplas personalidades. O que sobra da identidade original de alguém que a torna pública e cuja vida digital ultrapassa a real? Quem domina o verdadeiro alter ego? Como concorrer com avatares de centenas ou milhares de amigos e relacionamentos que não param de crescer e multiplicar? Corremos o r

Voltando às origens

Nos últimos anos temos visto grandes empresas sumirem do mapa, algumas com décadas de existências ou centenárias, assim como profissões que se extinguem ou então passam por mudanças radicais.  Isso leva a uma grande questão que vale para empresas e profissionais, no que se refere à identidade, valores e proposta de vida. As empresas tem algo a ver com as pessoas e vice-e-versa. Lá no fundo de nós existe uma semente inicial, que é ao mesmo tempo nossa verdade e o motor que nos impulsiona todos os dias. Mas em alguns momentos nos perdemos desta referência. Neste processo podemos simplesmente sair da estrada e demorar para retomar o caminho.  Quando os tempos são acelerados ou após muitas mudanças de curso isto talvez fique ainda mais complicado. O banco do qual sou cliente já mudou de marca três  vezes nos últimos anos e continua no mesmo lugar. Alguns dos funcionários ou gerentes ainda conheço.  Não posso deixar de imaginar e tentar entender em tempos como